Porque o povo não é bobo!
Organizações populares elaboraram um projeto de
iniciativa popular com 33 artigos para regulamentar o que diz a
Constituição em relação às rádios e televisões brasileiras
04/07/2013
Maria Mello
de Brasília (DF)
Do
alto do prédio, escorada em uma parede, a repórter entra ao vivo no
intervalo do jogo para atualizar a situação de confronto na manifestação
que acontece lá embaixo, na rua já praticamente esvaziada. Seu cameraman tenta aproximar a imagem das pessoas e quase perde o foco.
A
cena poderia remeter, à primeira vista, a um possível resguardo dos
profissionais de comunicação em relação à violência policial deflagrada
nos protestos recentes, que não poupou nem jornalistas. Um olhar mais
atento, porém, revela que o temor ali era outro: o de que se tornassem
alvos dos manifestantes.
Por que a marca das
grandes emissoras de televisão nos microfones, coletes e veículos se
converteu, tão rapidamente quanto os levantes, em objeto recorrente de
protestos nas manifestações em todo o país?
A
evidente "virada" editorial empreendida pela cobertura feita do alto dos
helicópteros das redes de televisão ao longo das últimas semanas pode
ser uma pista da insatisfação da juventude em relação aos meios de
comunicação tradicionais. O que de início fora taxado pelo paladino da
democracia ditada pelos barões da mídia, Arnaldo Jabor, de "burrice
levada a cabo por revoltosos de classe média que não valem 20 centavos"
se tornou, dois dias depois, um "momento histórico lindo e novo".
Transfigurar
as variadas pautas populares - em grande medida emanadas das redes
sociais, que se estabelecem como canais de comunicação não mediada cada
vez mais presentes na vida política do país - em clamores
especificamente relacionados aos seus interesses, impondo bandeiras
genéricas e antipartidárias e ditando comportamentos potencialmente
reacionários, tem sido a tônica atual da cobertura da mídia
oligopolizada brasileira.
É frente a este cenário
que movimentos sociais de todo o país vêm promovendo assembleias
populares e aulas públicas, nas ruas, para discutir a cobertura das
manifestações e a necessidade de fazer avançar políticas públicas que
contribuam para reverter o quadro de concentração midiática que obstrui a
efetiva liberdade de expressão no Brasil.
Nelas,
são discutidos temas como a universalização da banda larga, o Marco
Civil da Internet - Projeto de Lei que garante a liberdade de expressão e
o direito à privacidade do usuário - e o Projeto de Lei da Mídia
Democrática, lançado em maio passado, que pretende ampliar a liberdade
de expressão e promover a diversidade e a pluralidade de opiniões nos
meios de comunicação. O projeto, de iniciativa popular, traz em 33
artigos propostas para regulamentar o que diz a Constituição em relação
às rádios e televisões brasileiras.
A marca de 1
milhão e trezentas mil assinaturas colocará o texto em debate no
Congresso Nacional. "Vamos levá-lo para as ruas e recolher as
assinaturas necessárias. Se esse projeto não veio de quem tinha de fazer
- o governo brasileiro e o Congresso -, virá da mão do povo", aponta
Rosane Bertotti, coordenadora do Fórum Nacional pela Democratização da
Comunicação (FNDC), entidade que impulsionou a criação do projeto. Os
materiais de divulgação e o kit para coleta de assinaturas podem ser
encontrados em www.paraexpressaraliberdade.org.br.
Além
dos debates públicos, também estão sendo agendados em todo o país
protestos em frente às sedes da TV Globo - símbolo máximo da estrutura
midiática concentrada - e de outras empresas representantes da hegemonia
dos conglomerados de mídia nos estados.